Friday, August 5, 2011

Arrogância de gente pobre estraga estratégia de loja VIP

Empório Santa Maria.

Ah! O nome diz tudo.

Ou dizia, até ontem.

Resolvi emendar um programa em outro, ficar sem almoçar. Na correria, para garantir caso tivesse um ataque de fome, peguei um pacote de biscoito light no empório com nome santo vip. Catei todas as moedas - 1,25.

O caixa, uma mulher, disse: 1,35.
'Tenho 1,25. Não dá para passar?'
'Não. É um é trin-ta e cin-co'.
Apressada, disse 'obrigada' e saí. Não fosse a pressa, teria chamado o gerente e perguntado se eu não merecia 10 centavos como 'presente de aniversário' da empresa, que está promovendo campanha nesse sentido. Não, não está dando centavos aos clientes, mas presentes, ocasiões, mais nobres. Ou longe de pecuinhas, que partem de gente... metida a nobre.

O brasileiro tem muitos defeitos. Um dos piores é ser posudo, metido, sair esbanjando. Isso sempre foi deselegante. Hoje, está mais deselegante ainda. Mas a deselegância é outro dos piores defeitos de nossa nacionalidade.

Os supermercados e outras lojas cortam os centavos no troco. Como reclamar dois, três centavos?
"Posso ficar lhe devendo dois centavos"?

Isso quando fazem essa pergunta, que já tem como certa a resposta - "Claro, nin-guém vai ter a coragem de se humilhar e exigir os dois centavos".

Ora, que história sem nexo essa de humilhação! O sujeito, assalariado em geral, passa por humilhado se exige todos os centavos que SÃO dele. E a empresa - portentosa, chique, multi - não passa por 'humilhação" ao exigir, ela empresa, alguns centavos!?

O Empório Santa Maria fez questão ontem de 10 centavos. Faço eu questão de deixar isso bem registrado. Porque, se essa loja de luxo não pode se dar o luxo de dispensar 10 centavos, quem de nós é que vai continuar a ser menosprezado por exigir todos os centavos que lhe cabe?

Tampouco há como engolir desculpas sórdidas como "se falta alguma coisa no caixa, a funcionária é quem paga". E se sobra "alguma coisa" no caixa? Ah! Aí, ninguém declara para quem vai a tal sobra...

No dia anterior, no Extra Itaim, o caixa arredondou o troco 'para menos' e pronto: nada disse. Perguntei: quem fica com os dois centavos?

O raquítico rapaz, cara de deboche, retruca: a senhora quer os dois centavos?
São meus, respondi.
Ele me passa, por fim, cinco centavos e, enfaticamente, declara: a senhora me de-ve três centavos.

Vejam, ele não se sentiu nem um pouco 'humilhado' em exigir três centavos. Quando o outro lado exige dois centavos, ele reage com desdém.

Isso não é uma aula de contabilidade, mas de hipocrisia. Tal comportamento é a mais pura hipocrisia, condenada por Jesus nos evangelhos, livros adorados por tantos nesta terra. Ah! Adorar não basta, bem fomos alertados...

No fim, comemorei silenciosamente: no evento a que me dirigi, havia biscoitos à vontade. E sempre comemoro cada pequena poupança que consigo fazer, nesta terra rica, tão pobremente povoada, tão desastrosamente administrada. Em todos os planos e planaltos.

A aula de contabilidade:

"Dois centavos não dá para comprar nada"!

É isso que o brasileiro alega. Não sabe fazer de cabeça a continha mais elementar.
Então, toma os dois centavos isoladamente. Não soma.

Se você deixa dois centavos aqui, outros três acolá, etc. No final de um dia, você pode ter dispensado vinte centavos.

Vinte centavos por dia são mais de 70 reais no fim de um ano.

O que fazer com eles? Você pode ir a três sessões 3D de cinema, ou comprar um ou dois livros que, oxalá, mudem sua vida como ela deve mudar. Mas eu faria isto: iria até o Empório Santa Maria e tomaria o buffet de chá que a loja promove de segunda a sexta-feira. Quanto? R$ 42,90. Viu só? Ainda dará para ir ao cinema depois.

E, por favor, exija os dez centavos no troco, se bem que aquele valor virá acrescido de dez por cento como gorjeta. Que você pode pedir, com tranquilidade, para ser abatido. Afinal, o buffet é um autosserviço.

Se, contudo, as delícias lhe subirem à cabeça, se o deleite da ocasião o inebriar, considere os dez por cento - acolha a conta, que assim fica em R$ 47,19, fingindo que não conferiu nada. Se pagar com cartão de débito, melhor: evitará perder um centavo "de bobeira". Se colocar R$ 47,15 na mesa, correrá grande risco: é quase certo receber uma cara-torta de despedida, sem direito a "volte sempre".

Por causa de ínfimos quatro centavos. Vá entender!

Notas:

1. Cabe a empresa ter numerário para dar o troco exato. Se não tem como dar o troco exato, o consumidor jamais, jamais tem de engolir um troco arrendondado para menos. Isso é assédio. No Pão de Açúcar, o caixa declara a política da empresa como se fosse lei: "a gente faz assim, quando eu tenho de dar dois centavos a um cliente, em nada dou; quando tenho de dar três (a outro cliente), eu dou cinco. É assim que a gente faz".

Isso não é a lei, repito. Isso convém à empresa do "lugar de gente feliz". (que gente?)

2. Serviços são impossíveis de padronizar. Acaba prevalecendo não o treinamento, a ordem do chefe pura e simples, mas o que o próprio empregado faz de seu posto de trabalho. O que chamo de arrogância pode ser sinônimo da autoestima que busca, fundamentalmente, provar que a pessoa imbuída de tal característica é superior às outras. Em virtude disso, a empregada do Empório Santa Maria passou muita 'confiança' ao decidir, ela, não processar a compra, porque foi uma oportunidade de alimentar seu enganoso senso de superioridade, no caso em relação a mim: você é bonita, tem esse corpão, está "passeando" enquanto eu estou "aqui", mas eu passo a ficar "por cima": a bolacha você não leva. Nem 'de longe' passa pela cabeça dessa empregada considerar os desdobramentos, para a empresa, de seu comportamento regido por tais 'forças' imperiosas que ela não reconhece.

Minha experiência corrobora que não há treinamento que supere isso. Uma pessoa como aquela empregada do empório não é capaz de se ver como representante da empresa e que, portanto, tem que represar seu ego, não equilibrado com seu posto. É também por isso que somos tão frequentemente recebidos com "eu não tenho culpa" quando fazemos uma reclamação. É raro encontrar um empregado que tenha assimilado que ele é um representante da empresa e, portanto, cabe a ele ouvir e encaminhar toda e qualquer manifestação de um cliente. Aquela reação, tão comum, revela justamente o contrário: eu, empregado, não estou 'na pele' da empresa. E é provável que tenha resistências a se colocar na 'própria pele', em outras situações da vida.

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