Wednesday, July 28, 2010

Graças por musa e miragens

GRAÇAS POR MUSA E MIRAGENS

MARIANGELA  PEDRO

                                        
Uníssonos servis, sacrifícios talhados em prosa
Anuviam inquebrantável rotina espinhosa.
Salvação à alma que, confissão tormentosa,
Terços salteou, ajoelhou-se no breu
Jamais pediu pelo pão que comeu.
Consagração ao fruto daquela que, misteriosa,
Em dúvida suprimiu do altar da vida seu caro eu.
                          
                           Chamado
Vais e vens absorto na lida fastidiosa
Repleta de pitos, sustenidos e, na escolta,
Bispos portando índole ardilosa.
Fartos cachos de santa, presença vertiginosa
Entregue, por incerta jornada, ardorosa.
É a musa que liberta tua natureza desenvolta
Tolida desde que em dogmas fora envolta.
Em teu templo passa a ressoar imperiosa
A voz da intrusa: "a certeza não é virtuosa".
                           
                         Dividido
Ao deitares por fim livre da veste solta,
Alheio aos ritos e mitos da trilha ditosa
Combates as tentações de uma paz odiosa.
Relegada supérflua a arca de Noé,
Família santa é só a de José.
O messias teme o homem que é
A mulher que o ama, denegrida é
Apenas óbitos são registrados na Sé.
                         Isolado
A disciplina demanda a penitência
A fraqueza sustenta a onipotência
A infância perde à força a inocência
A irmandade recende a indecência
A congregação preza a aparência
A cátedra amarga a maledicência.
Apenas tu confrontas a imanência.
                      Desafiado
Incitado a sina como poucas tão briosa,
És exposto em arena contenciosa
Onde se revela tênue tua aura piedosa
Que zelava por confundir fé com coisa douta
E mal sobrepujava a consciência revolta.
                      Intrépido
A massa ao léu reúnes no equinócio.
Coíbes o vicioso orar por vantagens
Apontando réu quem alicia percentagens.
Tua homilia prenunciava a coragem
De amadurecer e rever o sacerdócio.
Quem prega por ofício, qual mal do ócio,
No reino do céu, dizias, não tem sócio.
                      Quase esquecido
Se em vida eras verdade, post mortem
Iludiram muitos ao emendar passagens,
Fez-se teologia da convulsiva mensagem.
Pregaram, um tanto fartos de Belém,
Que alhures o Espírito surgiu do além
Misturando o fogo, a luz, a cruz - renovação?
Do horror da nova era emergiu outro amém.
Quem protestou logo se calou na investigação.
Hoje só alguns acalentam, como miragens,
O fim da doutrina da fé como negócio
E a eternidade vivida como camaradagem.

Concorreu ao Prêmio FLIP 2010 (Feira Internacional do Livro de Paraty), sem obter classificação.


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