Thursday, October 1, 2009

Artemisia na FEA - surpresas e um festival de fachadas ruindo


Desde dia 29, participei do evento na FEA-USP, intitulado Empreendedorismo e Sustentabilidade - www.sustentabilidadefea.com.br


Anteontem, 29, conheci a Leila Novak, da Papel Solidário. Trocamos "poucas e boas", após sua primorosa palestra. Ofereci-lhe meu talento, especialmente como escritora, para proveito de sua própria associação. Ela insistiu para que eu estivesse no workshop de hoje, da Artemisia. Bem... eu cheguei para o segundo tempo. E isso foi na "medida".

Havia grupos trabalhando, uns no auditório, outros na área anexa, de "coffee break". Sentei-me ao lado de um dos grupos, apenas ouvindo. O rapaz "japonês", representante da FEA Júnior, aproximou-se e disse-me que "os grupos, senhora, já estão formados". Não estou interferindo, apenas ouvindo, respondi. "Por favor, vá para o auditório. Pode entrar com a bebida, sem problema"! Muito antipático. Muito.

Então, tomei nota do slide que estava projetado, na tela do auditório. Pouco depois, um aluno da Guiné Bissau, estudando aqui em outra universidade, me chamou: "Junte-se a nós". Lá fui.

Logo os grupos apresentariam suas ideias de um novo negócio social. (Fiquei de fora.) A apresentação deles tinha sido orientada pelo esquema projetado naquele slide, que era o seguinte:

Nome do Negócio Social

Qual o seu produto

Oportunidade e público-alvo

Proposta de valor e impacto social

Diferenciais e vantagem competitiva

Após a apresentação das ideias dos grupos - todas curiosas, bem justificadas, considerando que os proponentes eram estudantes de graduação -, Carolina de Andrade, coordenadora da Artemisia pediu à plateia para que apontasse dificuldades para os empreendimentos sociais: "o que vocês acham"? Perto do fim disso, me ocorreu algo, relativo ao slide ainda projetado - os cinco itens acima (nome do negócio, etc.). Não tive, porém, oportunidade de falar, pois Carolina passou rápido a palavra para o outro expositor, um de seus associados, ou seja, um empreendedor que foi assistido (ou ainda é) pela Artemisia. Quando este abriu para perguntas, eu levantei a mão. Critiquei aquele roteiro de cinco itens assim, depois de me desculpar por estar rouca:

"Participei das outras etapas deste evento. Com a palestra da Leila, ficou claro, ao menos para mim, que o principal ... diferencial - para usar de novo esse termo (indicando que não gostava disso) - é a mentalidade. O negócio social requer uma mentalidade diferente e eu então percebi também que a "missão" do clássico planejamento estratégico tem, ali, de fato sentido. Com esse primeiro passo - a definição de missão, do planejamento estratégico - passamos a ver quase todas as empresas com um quadro na parede, com disseres alusivos ao social, que não nos convenciam daquilo. Esse planejamento estratégico convencional espelha muito bem o "desvirtuamento" que você (Carolina) acabou de mencionar. [Ela dissera que todos os negócios, antes, nasciam sociais e que, depois, houve "esse" desvirtuamento]. Entretanto, vocês mesmos usam, nesse roteiro, os termos consagrados desse desvirtuamento, deixando de fora justamente a missão. Temos, assim, uma mistura, algo esquizofrênico, que junta "social" com o batido do planejamento estratégico. Notei, ainda, que o clássico esquema da estratégia prevê "oportunidades-ameaças" e "pontos fortes e fracos" do negócio, e que vocês praticamente não falam das ameaças, e nada dos pontos fracos. Considerando o conceito de um genuíno "negócio social", não me fica claro o que vocês querem dizer com "vantagem competitiva" nesse esquema."

Foi uma crítica que nossa "cultura" - tanto propalada, levianamente também, por todos - não sabe assimilar. Isso é muito mais típico de nossa cultura do que a alegada falta de espírito empreendedor. Soberbamente evidenciador disso foi a resposta que o afiliado da Artemisia, o sujeito da Tekoha então de pé diante da plateia, deu à minha crítica: "Sou amigo da Leila"... Fiz uma expressão "e daí?' Ele, desconexamente, deixou escapar que "não falamos dos pontos fracos para não desanimar".... O propósito não é desanimar, corrigi. A Carolina então interferiu: "Você perdeu nossa apresentação, podemos falar mais no café". Claro, aquilo era uma estratégia, para ganhar tempo, para impedir mais abobrinhas. Ou, talvez, ela de fato preferia conversar durante o café. Eu estava enganada.

Quando Carolina finalmente adentrou a área do café, passei a observá-la. Ela não circulou, mas ficou "grudada" junto à pequena mesa com as bebidas. Eu estava na outra ponta da área. Quando percebi que ela não sairia dali, fui até lá. Ela, em nenhum momento, passou os olhos sobre mim. Verborrágica, gesticulava com exagero. Nâo posso dizer se isso é típico dela, já que não a observei antes. No auditório, ela foi mais contida. Reposicionei-me para ficar no ponto oposto ao dela, de modo que ficasse ainda mais difícil para ela me ignorar. Ela, como esperava, virou-se, ficando novamente de lado em relação a mim. Comentei a fuga de Carolina com outra participante do evento, ali ao lado da mesa também. Carolina se afastou um pouco e eu disse para a outra: Vou até lá, ver até onde ela vai fugir. Então, só uma pessoa falava com Carolina. Eu fiquei ao lado, um tanto atrás da sua interlocutora. Quando esta se afastou, Carolina abaixou a cabeça e foi embora, ainda me ignorando, agora de forma flagrante. Então, fui atrás e perguntei calmamente: Carolina, você quer me dizer alguma coisa"? Não. Ela estava vermelha. Sua resposta era de alguém magoado. Uma resposta puramente emocional, quase incontrolável. Tanto que ela disparou para a mesa de doces, que passou a comer com compulsão. Carolina, acho que você não entendeu meu comentário. Você está agindo defensivamente, o que é muito comum. "Tudo bem", ela corta, abocanhando um docinho, mantendo o padrão infantilizado. O que eu quis dizer, continuei ponderando, é que não devíamos simplesmente adotar o mesmo linguajar dos negócios... Ela desvia o rosto bruscamente, para olhar para "algo" atrás de mim. Escapismo mais flagrante do que isso, acho impossível. Imitei o gesto dela, tentativa para que ela se conscientizava de sua própria reação. E disse: "obrigada", indo embora.

Carolina... que "dinâmica de grupo" ia flagrar esse seu comportamento? E ele é tão típico, tão embotador de todo e qualquer aprendizado, tão... antissocial. Enfim, tão imaturo. Difícil convencer alguém maduro de que daí sai uma genuína preocupação com o social, com o outro. Como você tão facilmente excluiu o "outro" - eu!

Carolina e a Artemisia, segundo ela mesma, querem transformar São Paulo num polo de negócios sociais. Não duvido de que o consigam, até certo ponto. Entretanto, um ponto distante, em certo sentido.

O representante da FEA Júnior, o japonês, também demonstrou uma mentalidade bem contrária ao genuíno negócio social: ele, nos instantes iniciais do coffee break, distribuiu uma ficha grande de avaliação das palestras daquele dia, que era diferente da dos dias anteriores, bem pequena. Mas ele passou por mim direto - não me deu a ficha. Sua mentalidade: não interessa ter o que ele via como uma avaliação negativa, na sua estreita e pragmática visão de mundo... visão que foi criticada durante todo o evento.

Voltando à mentalidade do empreendedor "exemplo": "Leila é minha amiga"...
É assim que fazemos negócios, com a mediocridade com que mantemos nossas relações. Carolina e seu afiliado, bem como os demais presentes - exceto o aluno com que falei no café, que me fez perguntas e por fim acatou minha crítica - sequer saberiam reproduzir o que disse. Tomaram aquilo como uma massa nebulosa indesejável, como uma "nuvem" que faz chover no orgulho, o que produz uma reação puramente emocional, cega. Cegueira em negócios?...

O evento terminou muito bem para mim. Um retrato real, contundente de nossa... cultura: paternalística (Leila é minha amiga - como se não pudesse ser também minha amiga, ou de qualquer outro), fortemente avessa a inovações e riscos - já que sequer assimila críticas, bem feitas, com racionalidade.

Esse é um quadro duro. Eu e a Leila nos despedimos, na terça-feira, falando justamente de que não podíamos perder a esperança.

Diante dessa realidade, é muito, muito difícil não perdê-la. Não é, Leila?



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