Friday, September 4, 2009

Quando o Creio em Deus Pai engordou - a Escola de Dresden em Praga e desdobramentos

Gente!


Acabo de descobrir por que no credo (O "Creio em Deus Pai Todo-poderoso, etc..) - "rezado" (jurado é o termo correto) na missa logo após o sermão - está incluído "creio na comunhão do santos".

Sabem, sempre tive essa dúvida. O que primeiro me vinha à mente é que isso dizia respeito ao santos que estavam no céu. Talvez quase todos os padres pensem isso também, e apenas recorram a lingugem mais emaranhada para não dizer mais nada além dessa concepção pueril.

O significado daquela "comunhão dos santos" está diretamente ligado a uma das maiores controvérsias da história da Igreja, envolvendo a Universidade de Praga e universidades alemães.

No início do século XV, havia, naquelas instituições, muitos pensadores que combatiam o Romanismo - a doutrina do papa, com base na qual ele exerce e justifica seu poder. Como o de excomungar.


O que é a excomunhão? É o ser expulso da Igreja pelo papa. Muita gente ainda pensa que isso é o mesmo que Deus, ele mesmo, bater com a porta do céu na cara do excomungado. Imaginem o impacto disso naqueles idos da idade média!


Aqueles pensadores divulgavam, entre muitas outras críticas ao Romanismo, a contraposição à excomunhão pelo papa. Chi... Já sacaram, não?

O que eles escreviam era muito acertado, lógico e bem-intencionado - transmitia forte preocupação em preservar a concepção original de uma Igreja de fato digna de um Cristo.


Para contrapor a excomunhão pelo papa, eles explicavam que havia duas coisas: a tal "comunhão dos santos" e a "congregação de todos os seguidores de Cristo".


Não são a mesma coisa?


Não. Vejam a diferença: a comunhão dos santos é um conceito abstrato - é a "comunidade invisível dos justos". Já a congregação de todos os seguidores de Cristo... é aqui que você, leitor, entra, se crê em Cristo, com todos os pecados de que você não consegue se livrar. Nas palavras daqueles estudiosos, a congregação é a igreja que existe, com as pessoas boas e más. A condição ideal, eles explicam ainda, é aquela em que as duas - a comunhão e a congregação - coincidem.


Então, eles argumentam que a exclusão da comunhão é uma decisão de Deus, enquanto a exclusão da congregação é um decreto dos juízes da igreja. Para se preservar aquela condição ideal em que comunhão e congregação coincidem, a decisão desses juízes deve ser apenas a declaração da decisão de Deus. Contudo, se os juízes erram em sua decisão de excluir, motivados até por razões nada divinas, o ato deles é desprezível, já que destituído de sua significância essencial.

Não disse que o pensamento deles era soberbo?

Mais especificamente, aquele raciocínio é de Frederick Eppinge, da Universidade de Praga, repito, início do séc. XV.

Eppinge era, mais precisamente, um Dresdener, um professor da Escola de Dresden, Alemanha. Foi para Praga porque o bispo de Dresden, em 1411, proibiu aulas sobre a Bíblia. Aquela escola se deslocou, então, para Praga.

Os ensinamentos anti-Romanistas daqueles professores são inspirados em um Mestre - Wyclifite, um inglês morto, como Jesus e trocentos de outros puros, pela Igreja de Roma (sim, a Igreja Católica Apostólica Romana).

Eppinge, ao propor, magistralmente, aquela distinção entre comunhão e congregação, estava encarregado de parte de um trabalho de grupo, já na Universidade de Praga: elaborar uma defesa do artigo número onze, do conjunto de doutrinas de Wyclifite. Esse artigo estabelece: "No prelate should excommunicate anyone unless he know that man first to have been excommunicated by God. Otherwise, in excommunicating him, the prelate becomes a heretic or excommunicate himself." Traduzindo:

Nenhum prelado (padre, membro da igreja) deve excomungar quem quer que seja, a menos que ele saiba que aquela pessoa foi primeiramente excomungada por Deus. Caso contrário, ao excomungar tal pessoa, o padre se torna um herege ou (= ou seja) excomunga a si próprio.

O título do trabalho de Eppinge, que sobreviveu em várias cópias, é: "Credo communionem sanctorum" - Creio na comunhão dos santos!

Portanto, ao proclamar isto na missa, você está confirmando o poder do papa de excomungar. E sem o saber - a condição perfeita para o poder supersutocrático. Você está declarando que a decisão do papa equivale à decisão de Deus. E os impuros são especialmente inclinados a crerem de fato nisso, desprezando todas as evidências contrárias, por mais contundentes que sejam. Grande verdade: nenhum poder se sustenta sozinho. Ou: Cada grupo tem o líder que merece.

Em suma, o "creio na comunhão dos santos" é um trabalho que serviu para a Reforma e que... Sim, a igreja trouxe para o lado dela.

Eu, surpresa? Bem, amiguinhos, eu não fico mais surpresa, depois de tanta vivência e estudo do Romanismo e do "anti-romanismo". A Igreja de Roma sempre foi assim: mata o sujeito que, de tão iluminado, não cai no lero lero dela. Depois, toma as obras daquele sujeito para ela, ainda que faça algumas adaptações, tire de um lugar e ponha em outro.

Foi sempre assim. Nada mudou.

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