O artigo que reproduzo ao final deste, além de algo que Ferreira Gullar não assumiria ter escrito (e não assumiu mesmo), pode ter levado ao impasse que resultou na não-renovação do contrato do então ombudsman da Folha de S.Paulo, Mário Magalhães. Eis a sequência de fatos:
1) Em 6 de março, envio meu artigo (em inglês) criticando o texto de Gullar, junto com outro comentário, em português, para aquele ombudsman, acompanhados de uma pequena mensagem.
2) Mário me responde (10/3), muito atencioso, dizendo ter separado meu artigo para ler naquele dia mesmo. Minha iniciativa era impulsionada, principalmente, pela revolta diante do silêncio imposto pela Folha. Nenhum comentário, carta de leitor, nada, nada foi publicado em reação ao texto de Gullar, que chega ao disparate dos disparates ao defender a descriminalização da pedofilia. Mário aceitaria ficar calado diante da minha reclamação pelo ardil do jornal? Certamente que não.
No início de abril, ele já estaria fora. Não aceitou renovar o contrato, por ter sido proibido pela Folha de manter as críticas diárias na internet...
O Blog do Favre publicou um "Tudo sobre Mario Magalhães", que não tinha tudo, na verdade. Ricardo Kauffman (em "Na surdina Folha esfria ombudsman") aventa a ligação entre a saída de Mário e eventos relativos ao dossiê de FHC, ocorridos na mesma semana. Julgo que o caso Gullar teria sido mais decisivo, além de poder abrigar, por sua ocorrência a três semanas do fim do contrato do ombudsman, um lapso para o desenrolar do conflito antes do "impasse" a que se refere o próprio Mario, cuja despedida foi também reproduzida no Blog de Favre, http://blogdofavre.ig.com.br/tag/mario-magalhaes/
Leia: minhas críticas ao artigo de Gullar em inglês; minha carta ao ombudsman do jornal, em português, vem seguida da resposta de Mário Magalhães, enviada a mim cerca de vinte dias antes de ele deixar de ser ombudsman.
O texto de Gular está ABAIXO. Os grifos (o negrito) foram adicionados por mim, nas partes mais absurdas.
Repressão e preconceito - FERREIRA GULLAR -
Folha de São Paulo, 24 de fevereiro de 2008
VAMOS FALAR a verdade: a sociedade em que vivemos é pura repressão. Já foi pior, claro, muito pior. Houve tempo em que as mulheres não podiam mostrar nem o pé, quanto mais as coxas ou a barriguinha, como mostram hoje. Naquela época, os homens apenas imaginavam como seria o corpo da mulher com quem iam se casar.
Hoje, podem vê-lo inteiro, da barriga às nádegas, com exceção talvez do púbis. Por que a repressão? Por mero preconceito, pelo propósito moralista que tomou conta da sociedade.Não nascemos nus? Por que então temos de andar cobertos de roupas, que nos escondem o corpo?
Disse que hoje as mulheres mostram quase tudo, mas isso na praia, porque, fora de lá, escondem quase tudo. Claro, não como antigamente, quando tinham que se cobrir de saias e mais saias, blusas e corpetes.E os homens? Esses, coitados, tendo que imitar os hábitos europeus, sufocavam dentro de roupas pesadas, paletós e coletes. O calor insuportável terminou por obrigá-los a aliviar a vestimenta, mas, até hoje, homem que se respeita usa paletó e gravata. Às vezes, alguns tiram a gravata, mas dificilmente tiram o paletó, a camisa, as calças; a cueca, então, nem pensar.
Por que não podemos andar nus como os índios? Não nascemos nus? Nos países frios, no inverno, admito, não dá para abandonar as roupas, mas, nos trópicos, as roupas são a expressão dos preconceitos morais e da repressão religiosa. Os únicos que se aventuram a ficar nus em pêlo são os nudistas, mas apenas em certas praias, e não por culpa deles; por culpa, sim, da hipocrisia social que obrigaria a polícia a prendê-los. Por que não se pode entrar nu num banco, já que obscenidades maiores são lá praticadas com permissão da lei?
A verdade é que a repressão está presente em todos os momentos de nossa vida. E de tal modo introjetou-se em nós que, quase automaticamente, vamos impondo-a sobre cada pessoa, mal começa a entender as coisas. Não pode pôr a mão na boca, o dedo no nariz, juntar a chupeta do chão e chupá-la, trepar na cadeira de balanço, aproximar-se do fogão, brincar com faca e tesoura, chupar bola de gude. Não pode nada, nada! Além disso, tem de obedecer aos mais velhos -mesmo os que tenham mais de 30 anos-, aturar as gaiatices dos irmãos, apanhar sem revidar etc. Em seguida, vem a fase escolar, que nos obriga a soletrar, decorar, aprender a ler, a escrever, a contar, a dividir, a multiplicar.
Ou seja, o sujeitinho que nasce livre é transformado em outra pessoa, metido numa camisa-de-força, engessado, robotizado. E se se rebela, paga caro; conforme seja, cortam-lhe a mesada; se insiste, termina internado ou preso, vira bandido. E depois reclamam que o cara virou bandido! Se ele gosta de birita, maconha, cocaína, crack ou ecstasy, é problema dele. Mas não, pai, mãe, polícia, a sociedade inteira se volta contra ele. E depois ainda se tem o desplante de afirmar que vivemos numa democracia. Como democracia, se o cara tem que se sujeitar às imposições sociais? Por quê? Se o cara cheira, fica doidão e sai assaltando os caretas, é problema dele. O assaltado que se vire. Eu gostaria de saber por que esse preconceito contra quem gosta de drogas. Não tem gente que gosta de alpinismo, de asa-delta, de mascar chiclete, comer chocolate, malhar na academia? E então? Cada um nasce com suas manias e preferências, que devem ser respeitadas pelos demais, do contrário não se pode falar que vivemos numa sociedade que respeita os direitos dos cidadãos.
A verdade é que não respeita. Nem o poderia, uma vez que quase nunca as normas sociais coincidem com as necessidades e desejos das pessoas. Por exemplo, se o cara tem preferências sexuais, que escapam ao que se chama de normalidade, está sujeito, conforme o caso, a condenações judiciais ou até linchamento por parte dos fanáticos defensores daquelas normas. Se o sujeito nasceu pedófilo, por que sua preferência sexual é considerada crime? Por que punir alguém que apenas obedece a impulsos inatos que lhe são impostos pela natureza?
Está tudo muito errado. Por razões que ignoro -mas que refuto liminarmente-, os homens escolheram reprimir seus desejos mais genuínos e seu modo espontâneo de vida em função de normas, disciplina, valores que, como observou Nietzsche, só favorecem os fracos e covardes. Só esses necessitam de leis repressoras para compensar a natural superioridade dos fortes.
Agora, se alguém me pergunta se permito que defequem em minha sala e não no vaso do banheiro, respondo que devem fazê-lo no vaso. E que dêem a descarga, certo?------
O texto de Gullar "Repressão e preconceito", seguido de meus escritos críticos a ele, postados como "comentário", também podem ser encontrados no site As Melhores Crônicas do Brasil:
http://cronicasbrasil.blogspot.com/2008/03/represso-e-preconceito-ferreira-gullar.html
Much of the discourse all around is power-oriented. Our texts, rather, will be appreciated by those brave enough to leave the good life of obedience in order to grow and take risks for the benefit of a multitude of others. Welcome! PORTUGUÊS acesse "apresentação do blog" abaixo
Monday, December 1, 2008
Gullar reclama: "Por que pedofilia é crime"? Folha abafa artigo de seu colunista e o ombudsman do jornal cai
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