Um grupo variado enfrentou a manhã gélida de hoje em São Paulo para se reunir na Fecomercio e pensar sobre... a reforma política.
Ele é ministro do Supremo Tribunal Federal
A principal fala foi de um dos ministros da suprema corte (STF), Enrique Lewandowski. Sua figura remete antes a um cidadão britânico - alto, pele alva, peso bem distribuído, meticuloso e extremamente hábil em manter o encadeamento do discurso. Só não resistiu a insinuar termos "menos acadêmicos". Ultrapassou o tempo previsto para a exposição, mas ninguém pareceu incomodado e Cláudio Lembo, presidente da mesa, classificou o excesso como um salutar "trabalhar muito".
A prof. Mônica Herman, única mulher à mesa, falou por último e quase rouba o espetáculo. Sentado, Lewandowski espelhou-se nos demais, relaxou e, finda a intervenção da professora, a ela mostrou o dedão para cima, por trás do presidente da mesa. Ela abraçou posição contrária a do ministro em relação ao sistema distrital - que ele acabara de defender, antevendo as críticas mais diversas.
Com contradições atrás da orelha
Embora o ministro tenha frisado que a reforma eleitoral não pode anteceder a reforma política, foi sobre o sistema eleitoral precisamente que os ouvintes aprenderam. Uma aula exaustiva, a mim parece. Os aplausos indicaram que pelo menos a grande maioria estava muito satisfeita. Agora, contudo, tento me aquecer tentando debelar significativas contradições que para mim despontaram do encontro.
Uma delas decorre do seguinte: foi consenso entre os palestrantes que o voto facultativo é "desnecessário" - já existe de fato. E o comparecimento às urnas, por conseguinte, demonstra o quão "envolvido com a escolha de seus representantes o povo brasileiro é". Ao mesmo tempo, frisou-se, também consensualmente, que o sistema atual permite que a vontade do eleitor não seja acolhida, pois muitos são eleitos no "vácuo" de outros. E o eleitor sequer sabe disso, os palestrantes também registraram. Então, concluo, temos um envolvimento estranho desse eleitor...
Temos um eleitor que permanece fiel às urnas, apesar de levar ao Congresso quem ele não deseja, ou sequer conhece ou cogitou em algum momento. Algo parece ter sido omitido no evento; algo que ora me remete ao coronelismo.
Lewandowski proclamou a plena transição brasileira de uma democracia representativa para uma democracia participativa - o Ficha-Limpa como prova. Quem notou outra profunda contradição quando o deputado Paulo Delgado, lembrando que estávamos numa associação do comércio, a seguir evocou a maturidade da cidadania no consumo, em relação a qual a cidadania eleitoral "está muito atrás"? Vi o ministro acenando concordância com a cabeça antes de o deputado fazer - quão improvável nesse contexto! - a audiência vibrar diante de sua comparação muito simples: "Há a PROCON. Deveria haver uma PROCON para quem pudéssemos devolver um deputado defeituoso"! Foi esse o comentário que recebeu aplausos efusivos.
Muitas metáforas, rasa coerência
Lewandowski, que me fez permanecer de olhos vidrados quase todo o tempo, me confundiu no final ao declarar que tomar medidas tópicas seria como viajar sem rumo. Imediatamente a seguir, visivelmente pressionado pelo fato de ter ultrapassado o tempo a ele conferido de início, faz afirmação contrária: que apenas três mudanças pontuais bastariam. Ainda por cima, completou com um argumento frouxo, mesmo impensável para uma fala tão bem estudada - que o atual sistema já existe há oitenta anos e que não faz sentido "colocar toda a construção abaixo". Isso lembrou-me de pronto de um certo sermão especial, proferido há muitos anos, na paróquia um dia de minha preferência. (Esse sermão é especial porque inspirou um dos meus livros.)
Mudar? Só um pouquinho
Pensando mais a respeito, percebo que, afinal, o ministro fez precisamente isto: uma incursão digna dos melhores exploradores, para não passar como alguém que está "sem rumo". Mas, e daí? O que vem depois? A covarde "prudência" de não demolir tudo. Ora. Prepare-se a vida toda para atravessar a nado o Canal da Mancha e, no final, contente-se com uma foto sua ao lado de um campeão. O arremate da fala do ministro foi uma decepção. Uma "saída", entretanto, nada incomum.
Diante disso, se formos tentados a uma síntese, teremos - recorrendo a termo "menos acadêmico" adotado pelo próprio ministro - um frankenstein: uma democracia participativa, com um eleitor brasileiro presente às urnas, mas "descolado" dos representantes que elege sem querer, sem saber. "Representantes" que são favorecidos pelo atual sistema eleitoral, proporcional. Uma democracia "participativa" em que nenhum eleitor acompanha as atividades de seu deputado, seu vereador. Ao mesmo tempo, tal democracia atrai países de toda a parte do mundo, dada a eficiência com que apura os votos.
Nossa democracia é, sobretudo, uma bagatela
Segundo dados apresentados por Lewandowski, essa tremenda democracia custa muito pouco, o equivalente a uma média, pão e manteiga em São Paulo: três reais e sessenta centavos por eleitor.
É uma estatística para pasmar-se. Não existe, contudo, tal democracia, não existe tal "engajamento". O Ficha-Limpa teve a Igreja Católica no timão. Por isso, navegou em mar excelso.
A cobertura do evento já está no site da Fecomercio.
http://www.fecomercio.com.br/?option=com_eventos&view=interna&Itemid=11&id=3899
Adendo (08.06)
O Mestre Ives Gandra também compunha a mesa. Falou muito, muito pouco. Deve, como eu, preferir escrever - e como ele escreve! Além dessa possível preferência, Ives pode ter praticamente se limitado a sorrir - com vontade e diversas vezes - por uma boa razão: o principal palestrante era do STF e contra o fato de este vir legislando, Ives recentemente argumentou - sem máculas - em artigo publicado na página A3 da Folha. Ives conclui sua "espinafrada" dizendo optar por estar de bem com seu Deus e consigo mesmo a ser "politicamente correto". Ajude-me, leitor: já não citei cabalmente Ives quanto a essa sua declaração outro dia?
Much of the discourse all around is power-oriented. Our texts, rather, will be appreciated by those brave enough to leave the good life of obedience in order to grow and take risks for the benefit of a multitude of others. Welcome! PORTUGUÊS acesse "apresentação do blog" abaixo
Monday, June 6, 2011
LEWANDOWSKI FAZ AUDIÊNCIA ESQUECER O FRIO E REQUENTAR A ESPERANÇA NO BRASIL - e adendo 08.06
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'-ERS' FELLOWS: LOVERS OF IDEAS; EXPLORERS OF THE SUBLE; THINKERS AND WRITERS OF INEXHAUSTIBLE PASSION. ULTIMATELY MINDERS OF FREEDOM.
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