Wednesday, June 30, 2010

Banco do Vaticano, curso Crise Mundial e a hipocrisia de se falar de rigorosa regulação de mercados

Resumo: Pergunta sobre Banco do Vaticano faz bancada de doutores empalidecer e calar. Durante curso na FEA/USP, perguntei, tendo em vista a ênfase das palestras em se passar a manter os mercados no cabestro, se havia uma estratégia - ou se pelo menos se pensava numa estratégia - para lidar com o Banco do Vaticano que, como "quase todos aqui [os presentes] devem saber, não se sujeita a nenhum organismo regulador e presta serviços [criminosos, como lavagem de dinheiro] não só para empresas, mas também para indivíduos" há várias e várias décadas...

A FEA trouxe Albert Fishlow, professor norte-americano emérito (caro, portanto), para curso "Crise mundial e ambiente regulatório", que teve oito sessões de tardes inteiras. Os membros da banca silenciaram diante de minha pergunta. Fishlow, que respondeu a questões em todas as sessões, abaixou a cabeça e claramente se "retirou". Então, para tentar remediar o constrangedor momento, Maria Helena Teixeira, da CVM, relutante, com a fala para dentro (ao contrário do que se mostrou durante sua exposição voltada para não se deixar "vazios" na regulação) e sem olhar ou se dirigir a mim, disse não saber se o que o Banco do Vaticano faz tem alguma importância e, tentando mudar de assunto, voltando-se apenas para a banca, comentou que o que a gente tem às vezes é um ou outro que não quer cooperar...
Eu voltei a falar, afirmando que, por certo, a atuação do Banco do Vaticano era relevante, uma vez que as quantias envolvidas são sempre portentosíssimas... (saiba mais abaixo)

Entre no site da FEA/USP e será impossível não notar a imagem com um velhinho totalmente grisalho, de pé, microfone na mão, sendo acompanhado por olhares atentos e, aparentemente, doutos. Trata-se do professor emérito da Universidade de Columbia, Albert Fishlow, que passa - ou passou - boa temporada aqui. Esteve também na tribuna do Fórum EUA-Brasil, dia 10 deste mês.
Na FEA, Fishlow palestrou em todas as oito sessões do curso "Crise Mundial e Ambiente Regulatório".
A imagem ora em destaque no site da FEA mostra uma senhora sentada ao lado de Fishlow, este ainda de pé. Ela é Maria Helena Teixeira, da CVM e, portanto, a imagem foi registrada na última sessão, a única da qual ela participou.
Tudo foi filmado e os organizadores do evento prometeram colocar tudo na internet. Duvido que o façam. Por quê?
Na última sessão, eu me levantei e fiz uma pergunta. Como eu esperava, as faces dos doutores na tribuna empalideceram. Fishlow abaixou a cabeça, como se quisesse se esconder, sendo que, em todo o restante do curso, esteve disposto a se mostrar e transmitr seu conhecimento. A única a dizer algo, sem jeito diante do pesado silêncio dos outros, todos homens, foi a executiva da CVM. E recorreu a panos quentes. Esgarçados. Isso não irá para a internet, claro.
O que eu perguntei? Sobre o lobo solto na floresta da "regulação total dos mercados" - o Banco do Vaticano.
Que coragem!!!, uma conhecida exclamou, quando lhe contei.
Vejam vocês o tamanho da manipulação da boiada. E boiada não é povão. Boiada é gente que é aceita para fazer tais cursos, em que são palestrantes a nata da boiada.
Naquele dia, aquela executiva da CVM acabara de dar uma palestra em que soara extremamente convincente quanto a não restarem mais "vazios" na regulação dos mercados, como que garantindo que crises como a de 2008 não se repetirão. "Há a cooperação e coordenação de todos os agentes reguladores". Não falava só do Brasil, naturalmente, mas do mundo.
Decidi não represar mais minha grande indagação. Pedi o microfone. "Todos aqui devem saber que o Banco do Vaticano não está sujeito a regulação alguma. Devido a isso, ele presta serviços não só a empresas, mas a indivíduos também. [não disse que tais serviços são criminosos, como a lavagem de dinheiro] Diante da ênfase em não se deixar vazios na regulação, minha pergunta é: há alguma estratégia, ou ao menos se pensa em alguma estratégia para se lidar com o Banco do Vaticano"?

Diante da perplexidade geral, por fim a executiva da CVM pegou o microfone e rateou: "Ele não tem jurisdição aqui. E não sei se o que faz tem alguma importância. O que a gente tem às vezes [virando-se e mudando de assunto] são alguns que não se mostram dispostos a cooperar..."
Eu rebati: "Por certo que a atuação do Banco do Vaticano tem importância; as quantias envolvidas são sempre portentosíssimas. Quanto a não cooperar, o que é alegado pelo Vaticano é que o Banco, regido diretamente pelo papa, está em estado independente e, portanto, não se sujeita a nenhum outro organismo ou instituição". E ainda puxei a cópia da matéria reproduzida abaixo, que saíra na Folha há dias: "Saiu esta matéria...", prossegui, ainda diante de queixos caídos e faces perplexas, e de um particularmente constrangido e cabisbaixo Fishlow.
Notem também que a alegação, persistente há muito, de que "temos autonomia, somos um estado independente" é feita só pelo Vaticano, e não por outros estados do mundo. Sim, o estado Cidade do Vaticano é diferente de todos os outros.
Enquanto o Vaticano faz e desfaz as crises, quebra o gigante que ele quiser (os bancos americanos em que o Vaticano é acionista não sofreram quebra...), sem aparecer, os outros Estados saem na mídia, fazendo a política que pode aparecer, tentando salvar empregos (não falam de gente...), proteger o comércio, o "básico". 
O que isso tem a ver com Deus?
Tudo. Afinal, você não chama de Deus aquele que está acima de tudo e de todos? Pois. Nisso, embora nas trevas, você está certo.

Ah! A matéria abaixo não teve chamada na primeira página do jornal. Saiu na última página do caderno "mercados" e sob o subtítulo: "justiça" (!?). O certo é que não haverá justiça nesse caso. O suspeito é Deus - não está acima de suspeitas, mas está acima de tudo o mais. Além do estranho subtítulo, passem a observar que todas, todas as matérias "polêmicas" sobre a Igreja Católica (ou o Vaticano), publicadas na Folha de S.Paulo, não mostram o nome de jornalista algum, mas sempre "das agências de notícias"... Que falta de coragem!
Ainda sobre a matéria, tenhamos em mente que não é só fora das leis italianas que está o Vaticano, como é dito. Ele está fora de todas as leis que não as dele mesmo. E vejam o exagero de panos quentes, no último parágrafo: está ambiguamente redigido de propósito, mas está dito que foi graças ao escândalo envolvendo o Banco Ambrosiano (que o Vaticano não salvou, mas matou todos os envolvidos "para garantir" que nada sobraria para ele: o executivo-presidente, sua secretária, etc..) que veio à tona "as ações" de Paul Marcinkus, presidente do Banco do Vaticano há um tempinho - 18 anos. Chato. Descobriu-se as ações, diz a matéria. Mas ela não diz que ações foram estas! E tudo acabou em pizza, ou em hóstia, porque, de novo, ninguém mete a colher no tal Estado Independente.
Marcinkus era um ignorante completo em bancos, finanças, tudo relacionado a isso. Mas caiu nas graças absolutas do papa cujo vida salvou, literalmente, em certo dia em que os dois peregrinavam pelo mundo. Marcinkus se escondeu durante pelo menos sete anos na cidade blindada (sim, o Vaticano). Por fim, voltou para Chicago, sua terra natal. No dia de sua morte, mostra seu CV na internet, ele foi para o "céu": a Igreja o promoveu ainda mais, criando um cargo exclusivo para ele.
Vi que o jornal O Globo também publicou matéria sobre isso.
Ainda vou atrás do jornal mencionado - o La Repubblica.

Banco do Vaticano é suspeito
de lavagem de dinheiro, diz jornal

Folha de São Paulo - 02 de junho de 2010 - mercados - B12
DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS
O Instituto para as Obras Religiosas (IOR), também conhecido como Banco do Vaticano, está sendo investigado pela Justiça italiana por suspeita de envolvimento em lavagem de dinheiro, de acordo com o jornal "La Repubblica".
O jornal afirma que as autoridades investigam um grupo de pessoas que tem residência na Itália e que estaria usando uma conta-corrente no Banco do Vaticano como uma forma de encobrir crimes como fraude e evasão fiscal.
O principal alvo da investigação é uma conta aberta em 2004 em uma filial do Banca di Roma (hoje Unicredit), identificada apenas como IOR. Por essa conta, teriam circulado 180 milhões de euros em dois anos sem que se saiba a identidade dos responsáveis pelas transações.
Segundo o "La Repubblica", dez bancos italianos estão envolvidos no caso, entre eles os poderosos Intesa San Paolo e Unicredit.
O Banco do Vaticano, que administra as contas de diversas ordens r eligiosas, assim como de associações católicas, é uma instituição da Igreja Católica que se beneficia da extraterritorialidade, já que se encontra na Cidade do Vaticano e não se rege pelas normas financeiras vigentes na Itália.
Como a Justiça italiana não pode interferir no banco, a saída é um pedido internacional para identificar as instituições e as pessoas que foram beneficiadas com as operações financeiras e saber se o dinheiro entrou ilegalmente na Itália.
O Banco do Vaticano esteve envolvido em um escândalo político-financeiro na década de 80, pela quebra, em 1982, do Banco Ambrosiano (do qual o Vaticano era o principal acionista).
O banqueiro Angelo Caloia, que deixou a instituição no ano passado, foi encarregado por João Paulo 2º, em 1989, de colocar em ordem a administração do banco após o escândalo do Ambrosiano, o que permitiu descobrir as ações do monsenhor americano Paul Marcinkus, que comandou o Banco do Vaticano por 18 anos, em um período marcado por suspeitas como envolvimento com a máfia e com lavagem de dinheiro.

SEARCH BOX ~ BUSCA

THIS PAGE IS DESIGNED FOR A TINY GROUP OF
'-ERS' FELLOWS: LOVERS OF IDEAS; EXPLORERS OF THE SUBLE; THINKERS AND WRITERS OF INEXHAUSTIBLE PASSION. ULTIMATELY MINDERS OF FREEDOM.