O Estado de S.Paulo publicou, no domingo, entrevista em que Edgar Morin declara que o principal problema do Brasil é a corrupção. Problema, assim, cabal e internacionalmente identificado por ilustre intelectual. Mas mal discutido entre nós mesmos.
Corrupção é termo abstrato, e refletir sobre coisas "vagas assim" é bem mais raro do que declarar, como a Maria Fernanda Cãndido, que "pensar cansa".
Disso discordo. obviamente. Meu próprio rosto é prova da falácia. Se pensar cansasse... já estaria até mesmo morta há "séculos", e espero que Maria Fernanda chegue à minha idade bonita como eu. Apesar de sua preguiça.
Pensar não pode sequer cansar a maioria das pessoas - elas são incapazes disso, no sentido estrito do termo. E isso é indicador de... corrupção. Quem não é afinado com o pensar, é afinado com a corrupção.
Corrupção não é coisa só de bandido ou político. Reiterando, ela é própria de todo o 'humano' para quem a ficha de genuíno pensar não caiu ainda.
Ontem, tive uma demonstração de corrupção que não dá notícia nos jornais, infelizmente.
Mais uma doutoranda obteve seu título de PhD na FEA-USP, no departamento de Administração. Foi aprovada por todos os membros da banca - o que sempre acontece, infelizmente. Mas não poderia ter sido sequer aprovada.
O trabalho de doutoramento a que me refiro está em destaque, no site daquela unidade da USP:
http://www.fea.usp.br/noticias.php?i=261
A sessão de defesa, que ocorreu ontem, por toda a manhã, invadindo o início da tarde, até às 13 horas, trouxe algumas novidades para mim, ao menos. A primeira: o orientador, à certa altura, declarou que não é mais permitido o laço de parentesco entre membros da banca e o candidato, bem como entre membros da banca. Então, isso era permitido?
Tal é inócuo, seja como for. O "laço" que persiste é ainda mais pernicioso do que o de parentesco - o da "política".
A outra surpresa, bem mais relevante, foi a participação da Profa. Tania Casado, como um dos membros da banca examinadora, o terceiro membro a fazer sua arguição. Mais precisamente, ela foi a única a fazê-lo. Bem claro, a fazer arguição.
Assisti a duas outras defesas, também na FEA, nos últimos dois meses, para constatar que não há arguição. Os membros da banca apresentam comentários, e o pontos fracos - aliás, muito fracos - foram apontados, nos termos de tais membros, como "sugestões para eventual publicação de um artigo". Constatei que declarar que "o (a) professor(a) tem razão" é o que basta ao candidato a doutor(a) para se sair "bem" diante de tais sérias deficiências.
Publicação de artigo? Gente, a tese tem de ser publicada na internet! E o é prontamente, a menos que o recém-doutorado solicite formalmente postergação de tal publicação, o que raramente se dá, segundo um dos funcionários da secretaria.
Com a arguição da Profa. Tania, ficou patente, em primeiro lugar, que a candidata não tratara o principal constructo do seu trabalho - "carreiras sem fronteiras" - de forma minimamente aceitável. A candidata totalmente ignorara os principais autores - indiscutivelmente consagrados no campo da pesquisa por ela empreendida. Ignorara, injustificavelmente, um autor em especial. A candidata não conseguiu, dada essa inicial e fatal deficiência, conduzir uma análise dos dados, que obteve no levantamento de campo, que ecoasse minimamente a teoria atinente ao tema da pesquisa. Ao ressaltar esse ponto, a profa. Tania obteve da candidata esta resposta: "Provavelmente eu teria conseguido [ter algum sucesso na análise]". Ao que a professora rebateu: "Certamente, você teria conseguido".
Tal deficiência esteve também presente nas duas outras pesquisas, cuja defesa assisti recentemente. Entre outras falhas igualmente graves.
A conduta da Profa Tania não deveria surpreender. Mas ela destoa em relação à conduta dos demais professores teoricamente arguidores, e isso é observável por todo humano, por mais desligado do contexto que seja. Sua conduta não deveria surpreender porque é a esperada em centros acadêmicos, quando a corrupção não impera.
"Eu li todo o seu trabalho com atenção, mas, por favor, qual é o conceito de "carreiras sem fronteiras"?
Então, a Profa. Tania expressou, com sua face, que recorria a dose extra de paciência, ao obter, da então finalmente arguida candidata, os batidos pedidos de agradecimentos pela presença da professora. Ao cabo dos clichés, a candidata indaga: "Devo responder agora"?
"Por favor"!, esclarece a professora, como se tal fosse algo extraordinário ali.
Evasiva, Elza, a candidata, hesitantemente afirma que não há "claro consenso" sobre o conceito principal de sua pesquisa.
Então, sintetizando a fala da professora, os presentes ficaram sabendo que "carreiras sem fronteiras" envolvia, essencial e primordialmente, a superação de barreira psíquica, o que a candidata totalmente ignorou.
Aqui entram minhas (ainda) mais contundentes observações:
Da sessão, ficou patente que a candidata não chegou nem perto da definição acadêmica do referido conceito, porque para ela, candidata a doutora, com propósitos de fato incongruentes com esse título, foi útil o sentido meramente anedotal do termo "carreiras sem fronteiras, sentido que o "mercado" muito convenientemente adota, superficial e deturpadamente, para justificar a não estabilidade de ninguém, enquanto assim interesse à empresa. Ainda nesse contexto, declarar que um profissional detém uma "carreira sem fronteiras"´equivale a tecer alto elogio a tal profissional.
E Elza assim se autoelogiou, em sua pesquisa de doutoramento. Ela escreve no trabalho que ela detém uma carreira sem fronteiras. Autopromoção ali tão condenável que, fosse eu membro da banca, não hesitaria em colocar minha carreira como professora doutora a perder por reprovar um "aluno de outro colega"; eu a reprovaria, ainda que tivesse a lamentar que, ao ser a única da banca a fazê-lo, assim não impedisse que a candidata saísse dali doutora. Doutora em... corrupção.
Fora também a Profa. Tânia quem afirmara que a candidata incluira tal assertiva, um autojulgamento sobre sua carreira, na tese. No que percebi como um ato quase "desesperado" - e típico dos raros professores de fato preocupados com o aprendizado, até na derradeira oportunidade para que tal ocorra - Profa. Tania interrompeu a "exposição" do quarto membro da banca, para "tentar de novo" e ver se "dá um estalo na Elza".
Mas o estalo não se deu.
Elza não vivera superação de barreira psíquica, para atinar algo crucial a respeito do tema, ainda que na tardia hora da defesa. Ela era apenas a típica candidata, que encheu páginas, fez "pesquisa" quali e quanti, encerrou abruptamente a tese - o que foi "comentado" pela outra professora da banca. E escutou, mantendo a - para mim irritante - etiqueta de academia corrompida, a comentários muito graves sobre seu trabalho. Que os demais membros apresentaram como "sugestões", correndo a declarar que "gostaram". Gostaram do trabalho.
Gostar não é verbo acadêmico. Nesse contexto, é verbo mais que corrupto.
Sem parentesco na banca? E daí? Como adiantei, reprovar alguém é dar um tiro no pé. Não, no pé, não; no coração. Ninguém sequer é assim "chato" como a Profa. Tania. Reprovar equivale a implorar por uma mortal estigmatização. A carreira - fronteiras à parte - de um professor doutor depende de participação em bancas. Ou seja, de convites, para que ele delas participe. Como se convida para uma festa...
E, no final da festa, a candidata Elza foi, como testemunha o costume da casa, aplaudida. Boa surpresa, eu não fui a única a não aplaudir dessa vez. Aplausos não eram merecidos e, antes disso, não condizem com ambientes acadêmicos. Se os aplausos viraram costume, é porque a reprovação não é hipótese de fato. Então, para que a defesa, a "defesa"?
Outros flashes da sessão de "defesa"de Elza:
- Usei a expressão "hipótese causal" porque Fulana também usa (ilustração cabal de incapacidade para argumentar). (Outro candidato também declarou isto: "Usei tal método porque tais e tais também usam". Hoje é doutor também.)
- Meu co-orientador no exterior sugeriu isso. (Ele não estava prsente. E, de novo, não há argumentação, mas se apontam "partidários".)
- Primeiro você determinou os objetivos. Depois, chegou ao problema da pesquisa? (pela Profa. Tãnia)
Diante disso, a candidata de novo tentou enrolar, mas admitiu, por fim: É isso... primeiro os objetvos (para mim o objetivo, claro e totalmente condenável - a autopromoção), depois o problema. Sem conclusão.
- Você obteve este dado! Não há diferença entre Ativos e PDVistas. Isso é extraordinário.
Tal eloquência partiu do segundo membro a fazer sua exposição, na sessão de Elza. O extraordinário de verdade é que Elza não fez esforço algum de argumentar acerca desse resultado, à luz da teoria relevante.
- Que bacana! Você coloca lado a lado, os dados (dados, apenas) da pesquisa qualitativa e da quantitativa. Geralmente, se tem primeiro os dados de uma, depois os da outra. (Comentário feito pelo mesmo segundo membro da banca, entusiasmado além do usual.) (É; grande coisa...)
- Há muito, muito tempo, não via uma tese com mais de quinhentas páginas! (Zilhões de tabelos e gráficos incluídos no corpo do texto, mas, o "extraordinário" mesmo, é ser o número de páginas explicitamente elogiado, diante de deficiências tão graves.)
Bottom line: "Pesquisa" - e de DOUTORADO - é listar o pensamento de outros autores, fartamente. Para garantir o título e os elogios, estes sim, extraordinários a meu ver. Listar, sem que o candidato "apareça". Não há análise crítica. Não há conclusão *tudo acaba abruptamente". A pesquisa é uma maratona de coleta de dados, de performance desconexa de "quali" (pesquisa qualitativa) e "quanti" (pesquisa quantitativa) - para o doutorado, "é preciso as duas".
Ora, não é "quali" e/ou "quanti" que deveria fazer o monge, o doutor. O essencial esteve ausente nas três pesquisas a cuja "defesa" assisti recentemente, quando foi declarado o seguinte, por membros da banca, apenas "a título de sugestões":
- Não há uma conclusão. Sob o titulo "Conclusão", você repete trechos presentes na análise. Análise e conclusão são duas coisas diferentes.
- Você cita tal autor, que critica o método. Em seguida, você adota justamente esse método. E não explica. Fiquei supercuriosa! (Curiosidade...não me diga...Seria fina ironia?)
- Agora sim (depois de apontar inúmeras "sugestões"); agora sim você escorregou. (só agora, sejam só): Você tira a média de sexo? É isso? (Sim, era isso mesmo que estava lá, na tese.)
Um "detalhe" final. O Regimento da USP reza que a tese de doutoramento deve contar contribuição original. Uma tese sem conclusão... como, então, é aprovada?!
A maior universidade da América Latina está assim. Corrompida, assim como o Brasil.
Melhor dizendo, assim como seu povo, alheio à sua fábrica extraordinária de doutores, povo apático, ignorante, faminto. Faminto de quê? Posso apostar: faminto de mais corrupção.
Ah, mais um "detalhe": não sou otimista como Morin.
P.S. Sou mestre pela FEA/USP, com trabalho "equiparável" a de doutorado. Na época - minha defesa foi em abril de 1994 - não era permitido tentar o doutorado sem ter o mestrado. Então - e ainda por algum tempo - havia NOTAS. Ou seja, cada membro atribuía nota ao candidato. Isso foi abolido: hoje há tão somente "aprovado" e "reprovado", o que facilita a mediocridade, a aprovação absolutamente... extraordinária, sem que restem marcas, facilmente observáveis, da origem de uma certa "queda" persistentemente acentuada.
Much of the discourse all around is power-oriented. Our texts, rather, will be appreciated by those brave enough to leave the good life of obedience in order to grow and take risks for the benefit of a multitude of others. Welcome! PORTUGUÊS acesse "apresentação do blog" abaixo
Wednesday, August 5, 2009
SEARCH BOX ~ BUSCA
THIS PAGE IS DESIGNED FOR A TINY GROUP OF
'-ERS' FELLOWS: LOVERS OF IDEAS; EXPLORERS OF THE SUBLE; THINKERS AND WRITERS OF INEXHAUSTIBLE PASSION. ULTIMATELY MINDERS OF FREEDOM.
'-ERS' FELLOWS: LOVERS OF IDEAS; EXPLORERS OF THE SUBLE; THINKERS AND WRITERS OF INEXHAUSTIBLE PASSION. ULTIMATELY MINDERS OF FREEDOM.