Monday, April 13, 2009

Wall-E: O amor que salva a Terra (e que pode salvar qualquer um de nós)

Eva entra no planeta devastado - e na vida robótica de Wall-E - como uma explosão, o mais forte dos tremores de terra, o mais implacável ataque, o que faz Wall-E tremer como nunca: escapou da arma de Eva por um triz!

Apesar de tanto medo, sentiu também incrível fascínio. E não mais tirou os olhos dela.

Eram em tudo diferentes, aquelas duas "criaturas", digamos assim. Mas tinham algo em comum. Para começar, um par de olhos - ou algo que valia como tal.

Wall-E - esse "E" à parte significava a predestinação de "Eva" em sua vida? (Ah! Como, Mariangela, você é capaz de notar esses detalhes que ninguém mais repara?!) Eva, o nome da primeira mulher, segundo certa conhecidíssima tradição.

Wall-E, em tudo, é a personificação do melhor caráter que se pode imaginar. Sozinho, totalmente sozinho, continua a fazer sua parte para restaurar o planeta. Ele é insignificante diante do lixo que cobre a Terra. Ainda assim, prossegue, contra todos os indícios óbvios, o evidente despropósito de sua luta, sem reconhecimento algum, sem recompensa alguma. A determinação incarnada.

E é assim que encontra uma bota velha, com um pouco de terra e uma plantinha viva: o único exemplar sobrevivente de um "processador de clorofila" de todo o planeta, um dia tão cheio de verde.

A sensibilidade robótica de Wall-E foi capaz de reconhecer o valor daquele estranho objeto. Wall-E não o reduz a nada, no seu incansável e mediculoso processo de produzir cubos de lata amassada, mas o coloca junto a outros objetos que ele decidira guardar tal como os encontrara.

Eva surge do espaço à procura de algo que não sabe o que é. Não possui sensibilidade semelhante a de Wall-E - é apenas programada, obediente a seu controle remoto. Assim, mesmo sem saber o que procura, ela o levará ao destino quando o encontrar.

Sei que ninguém sequer repara também nisso, mas volto a ressaltar que Wall e Eva são em tudo, e intencionalmente, diferentes: ele é quadrado, algo enferrujado, geringonça para "toda hora e todo serviço", feito fusca - e "Wall" tanto remete à sua lida de produzir paredes de lata amassada, quanto à sua capacidade de transformar a si próprio em um resistente, quase indestrutível cubo. Wall é, ao mesmo tempo, limite, amparo e coluna mestra. Ela é curvilínea, limpinha, high design. Ele se desloca com os antigos mecanismos de um tanque de guerra, enquanto ela, high tech, flutua, está sempre acima do solo. Mas, observem, Wall-E é capaz de se autoreparar, de consertar a si. Eva, em contraste, veio de uma estação espacial na qual tudo tem seu lugar e sua função rigidamente predeterminados. Wall-E teve de aprender a se virar, a ser tudo. E, justamente por isso... fica fascinado pelo aparente poder de Eva, que não hesita um segundo, simplesmente porque - Wall não o sabe ainda - ela é, quando ele a conhece, apenas um robô ipsis literis!

Logo chega o momento de Eva ser levada de volta para o espaço desconhecido, portando a tal bota com a plantinha. Mas Wall-E não pode mais viver sem Eva... E, por ser um robô que reinventou a si próprio, e agora se autogoverna, Wall-E é corajoso e se agarra à nave espacial em que Eva viaja, ela apenas, conforme o figurino.

A mais comovente é a passagem em que é Eva quem ajuda Wall-E a recuperar a memória... E assim, inseparáveis, firmemente comprometidos um com o outro, em suma, total e irremediavelmente unidos pelo amor, os dois vão assimilando as características um do outro e, por fim, conseguem trazer todos os sobreviventes terráqueos, que estavam naquela estação espacial, de volta à Terra. Mas, não deixem de notar, eles não tinham consciência de seu Destino, de tão audaciosa missão, que estaria predestinada a ser por eles levada a cabo.

E tudo recomeça aqui, graças à plantinha encontrada por Wall. E à quebra total de rotina que o "casal" enamorado provoca na tal estação espacial, onde todos vegetam, mas estão convencidos de que aquilo é a Felicidade.

O filme é memorável por sua sutileza. Tudo parece apenas brincadeira, e assim ele é considerado um programa infantil. Quem cresceu para conhecer o Amor, vê nele uma original paródia da força que tudo transforma, tudo reconstroi, e que une os que vivem em mundos diferentes, até então incomunicáveis. Como secundária, há a apologia ao verde, a valorização da vida, por mais insignificante que pareça. E o pungente alerta sobre o sedentarismo, e a falta de caráter que leva os terráqueos "exilados" a serem controlados por máquinas, de tão preguiçosos, enburrecidos e apáticos.

Nessa estação, em total contraste com o amor de Wall-E e Eva, os terráqueos não se comunicam mais, sequer se entreolham. (Pois é, você não notou isso também...) Estão num eterno parque de diversões programado, com a visão do paraíso, enquanto apartados dele. São mantidos na moda - todos usam a mesma coisa, a mesma cor, ao mesmo tempo. Todos são constantemente alimentados com coisas de que seus corpos não precisam, e não se exercitam, até porque seus ossos já estão em muito atrofiados, de tanta indolência disfarçada de conforto.

Mas basta um casal apaixonado - identificado como "invasor" e "contaminador desconhecido" -entrar na estação para evidenciar o absurdo de tal sistema e, antes de restaurar a Terra, reavivar a consciência daqueles terráqueos tornados reféns de um estilo de vida que muitos classificam como o "american way", mas que há muito deixou de ser apenas americano.

Tal retomada de consciência é rapidamente explorada, mas o é suficientemente para tecer uma crítica mordaz. Um dos terráqueos, com o distúrbio que o sistema sofre devido aos "invasores", de repente brada: "Não quero sobreviver! Quero viver!" E o script prossegue em seu quase delirante dinamismo, para deixar vibrados os olhos dos baixinhos (e pregadas nas cadeiras, suas bundas). Contudo, quem já passou de fato desse estágio pueril captou a mensagem.

Que estas linhas levem você a ver de fato o filme. E, a partir disso, voltar a ver a vida com os Bons olhos. E a ter a altivez de viver o Amor, quando ele surgir na sua vida, tão apavorantemente como ele surge na vida disciplinada de Wall. Wall-E.


Nota: Wall-E foi um dos apontados entre os "Melhores Filmes de 2009" - festival em exibição, até o final do mês, no CINESESC. Wall-E será exibido apenas mais uma vez, no domingo 26, às 14h30. Preços, como sempre, reduzidos.

Mariangela
13 de abril de 2009

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