No dia 17 de setembro de 2012, a primeira página da Folha de S.Paulo estampava:
Igreja Católica abre ofensiva contra eleição de Russomano
A arquidiocese de São Paulo deflagrou ofensiva contra a candidatura de Celso Russomano (PRB). Determinou que uma nota do cardeal arcebispo d. Odilo Scherer com críticas à campanha dele e à "manipulação política da religião" fosse lida nas missas de domingo em 300 igrejas da cidade.
Russomano respondeu que não iria polemizar com o cardeal. "Não vamos fazer guerra santa". Poder A6 e A8
Na página "poder A6", a manchete era:
"Russomano é alvo da Igreja Católica em missas dominicais".
A guerra santa de fato já começara dias antes. O primeiro turno estava muito próximo - 7 de outubro - e Celso, segundo as pesquisas dos órgãos de sempre, ganharia a eleição para a prefeitura de São Paulo já nesse turno, impingindo derrota a José Serra e... ao atual prefeito.
Voltando à página A6 do jornal, aquela manchete aparece abaixo de uma imagem de José Serra sorridente, abraçado por uma possível eleitora.
A matéria que se segue não é assinada; nenhum jornalista firmou-se como responsável pela descrição de como a Igreja Católica estava interferindo nas eleições para a prefeitura de São Paulo, enquanto o cardeal que comandava tal operação era ali citado condenando, ele, o uso da religião para fins políticos. Essa é uma página de jornal que deve ser impressa, emoldurada e pendurada em paredes por este País afora. Deve ser exibida, inescapavelmente, ao lado da Cruz de Cristo encontrada em órgãos públicos, inclusive na Suprema Corte.
Como imprimir a página? Qualquer página da Folha de S.Paulo pode ser impressa a partir do site acervofolha.com.br.
A operação de Odilo
Os principais movimentos de Odilo Scherer, cardeal chefe da arquidiocese de São Paulo, nessa operação contra Russomano-prefeito foram:
13.09.2012
Scherer emite nota de repúdio no site da Arquidiocese.
Repudia uma postagem de maio de 2011, sim, de mais de um ano e meio antes, de autoria do pastor Marcos Pereira, presidente do partido de Russomano.
Tanto tempo depois, Scherer fica bravo?
Essa reação do arcebispo, em setembro de 2012, veio junto com outra coisa: o desempenho de Russomano nas pesquisas.
- Pesquisa Ibope em São Paulo
Observe, no rodapé do gráfico, as datas. A pesquisa realizada entre 10 e 12 de setembro mostra o ponto máximo de Russomano e esse máximo representava que ele ganharia a eleição já no primeiro turno, marcado para 7 de outubro, dali a menos de 30 dias. Haddad tivera uma subida vertiginosa, mas desde a pesquisa de 28.08 retrocedia pouco a pouco (linha vermelha). José Serra vinha escorregando há tempos. Então, sem demora, vem a nota brava de Odilo Scherer. Era mesmo o primeiro tiro da guerra santa contra Russomano. Ou, se preferir, a favor de Haddad.
O conteúdo completo da nota está reproduzido na parte final desta postagem, de modo que você verifique que Scherer logo cita o nome de Celso Russomano, para atacar um texto que não é dele. O esquecimento calculado: Odilo não diz na nota que o texto tinha sido postado há mais de 18 meses.
16.09
Odilo Scherer faz "sermão eleitoral" em plena Catedral da Sé.
Segundo matéria do G1 de 17.09, "Em novo texto, Dom Odilo critica chefe da campanha de Russomano", Scherer reiterou sua indignação em mais um texto de sua autoria, lido durante a missa das 11 horas, por ele celebrada, no dia anterior, na Catedral da Sé. Esse texto é intitulado "Política, com ofensas à Igreja, não!"
Omitir a data dessas "ofensas com política" não seria pecado? As ofensas estavam num texto de maio de 2011, que servia tanto como "ofensa", justamente naquele momento, por ter sido escrito por alguém muito ligado à campanha de Celso Russomano para a prefeitura.
17.09
Folha de S.Paulo denuncia que Scherer mandou que esse segundo texto, lido por ele na Catedral da Sé, fosse lido em 300 igrejas de São Paulo, durante missas de domingo. Também segundo a Folha deste dia, o próprio Scherer disse: "A manipulação política pode colocar em risco a paz social"...
20.09
Odilo Scherer reúne 4 dos candidatos à prefeitura para debate, e Celso Russomano não está entre eles. Os quatro: Serra, Haddad, Chalita e Soninha.
Voltando ao gráfico acima, com pesquisas Ibope, vemos que, a partir da pesquisa de 22.09, Celso rola sem parada, para, por fim, perder a eleição. O segundo turno seria entre Haddad e Serra.
22.09
Celso e seu vice falam a portas fechadas com Scherer, à noite, na Cúria Metropolitana.
G1 publica estas palavras de Scherer, após esse encontro:
A gente está aberto ao diálogo, a acolher cada um que vem. Agora a gente precisa ver os passos seguintes. A conversa foi muito boa, mas não está em jogo simplesmente a conversa de duas pessoas privadas, são duas pessoas públicas.
Ou seja, o caso era de guerra mesmo. A Igreja venceria.
NOTA DE REPÚDIO publicada no site da Arquidiocese de São Paulo em 13.09.2012
O “Pastor” Marcos Pereira, presidente do Partido Republicano Brasileiro (PRB), do candidato à Prefeitura de São Paulo, Celso Russumano, partido que é manifestadamente ligado à Igreja Universal, publicou no seu Blog, em um site vinculado ao portal da Record, uma série de ataques à Igreja Católica (“Qual o futuro da educação no Brasil?” – R7). Numa clara demonstração de destempero, ele atribui à Igreja o tal "kit gay" do governo e se coloca totalmente contra o ensino religioso nas escolas, esquecendo-se que o “Acordo Brasil-Santa Sé” poderá ser interpretado a favor de todas as religiões. E não se impõe a ninguém, sendo a matrícula de livre escolha.
Qual seria o motivo para ataques tão gratuitos, infundados e ridículos à Igreja Católica em tempo de Campanha Eleitoral? Lamentavelmente, se já fomentam discórdia, ataques e ofensas, sem o Poder, o que esperar, se o conquistarem, mesmo parcialmente, pelo voto? É pra pensar!
Levou tempo e custou caro o retorno do Brasil à normalidade democrática. Vidas foram ceifadas até que os direitos mais elementares negados pelo regime militar fossem novamente respeitados.
Entre esses direitos, a reconquista do direito de expressão, de manifestação do pensamento, foi a mais festejada. Por isso mesmo, esse direito figura hoje entre os que mais são proclamados e defendidos. Até mesmo quando se ouvem ou se lêem posicionamentos ridículos, confusos, desrespeitosos e sem fundamento algum, como os de Marcos Pereira. Ele se pavoneia gritando um currículo invejável, como se isso lhe desse o direito de falar inverdades, para não dizer bobagens.
Deliciem-se os que gostam de perder tempo com as elocubrações fantasiosas de Marcos Pereira. Atribuir o malfadado “Kit Gay” e os males da educação no Brasil à Igreja Católica não faz nenhum sentido e cheira a intolerância religiosa, que nunca foi e nem deverá ser alimentada ou incentivada. Atribuir esses males à influência do Vaticano é um disparate tão grotesco que, sendo verdade o tão propalado currículo, o dono dele deve ter passado por um devaneio.
No seu destempero, Marcos Pereira vai mais longe, criticando o ensino religioso nas escolas, embora se afirme “Pastor”. Ele se bate contra a ditadura das minorias e nega o direito da maioria católica, que paga impostos e quer uma educação integral para seus filhos, educação intelectual, moral e religiosa. Queira ou não o nobre “jurista”, os católicos ainda somam mais de 60% da população brasileira (dados do IBGE 2010).
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Íntegra do texto de Dom Odilo lido na Catedral da Sé, em 16.09.2012
Política, com ofensas à Igreja, não!
Na atual campanha eleitoral para os cargos do Poder Municipal, a Arquidiocese de São Paulo tem procurado manter uma postura coerente com as disposições canônicas da Igreja Católica e com suas próprias orientações pastorais. Instruções foram passadas ao clero, para que os espaços e os momentos de celebrações religiosas não sejam utilizados para a propaganda eleitoral partidária, nem para pedir votos para candidatos. Estas orientações também estão sintonizadas com as próprias normas da Justiça Eleitoral.
Entretanto, a mesma Arquidiocese, através de seu Arcebispo e dos Bispos Auxiliares, também deu orientações e critérios sobre a participação dos fiéis na campanha eleitoral e na vida política da cidade e sobre a escolha de candidatos idôneos, embora sem citar nomes ou partidos. Essas orientações estão amplamente divulgadas. Entendemos que o voto dos cidadãos é livre e não deve ser imposto aos fiéis, como por “cabresto eleitoral”, pelos ministros religiosos; nem devem nossos templos e organizações religiosas ser transformados em “currais eleitorais”, reeditando práticas de uma política viciada, que deveriam estar superadas. A manipulação política da religião não é um benefício para o convívio democrático e pluralista e pode colocar em risco a tolerância e a paz social.
Também com este propósito, enquanto organização presente de maneira capilar na cidade, a Arquidiocese de São Paulo convidou os 5 candidatos, atualmente mais bem posicionados nas pesquisas eleitorais, sem distinção de partido, para um colóquio com o clero e os religiosos, no próximo dia 20 de setembro, para que os candidatos tenham a ocasião de apresentar seus projetos e propósitos de governo e, da parte do clero e dos religiosos, possam ouvir os questionamentos sobre assuntos que interessam muito o povo de São Paulo e dizem respeito a realidades e questões, nas quais as organizações da nossa Igreja estão profundamente inseridas e envolvidas.
Consideramos que a manipulação e instrumentalização da religião, em função da busca do poder político, não prometem ser um bem para a sociedade e não são coerentes com os princípios da liberdade de consciência e do legítimo pluralismo no convívio dos cidadãos. Além de tudo, isso poderia deixar divisões e feridas dificilmente cicatrizáveis no seio das religiões e das comunidades religiosas.
Muito nos entristeceu, no contexto da propaganda eleitoral partidária, ver a Igreja Católica Apostólica Romana atacada e injuriada, de maneira injustificada e gratuita, justamente num artigo do chefe da campanha de um candidato à Prefeitura de São Paulo. Coisas ali ditas sobre a Igreja Católica são difamatórias e beiram ao absurdo, merecendo todo o repúdio. Não foram ofendidos e desprezados apenas os fiéis católicos da Arquidiocese de São Paulo, mas de toda a Igreja Católica no Brasil, uma vez que o autor do infeliz escrito também é chefe nacional do partido que representa.
Semelhantes ataques são inaceitáveis e a Arquidiocese de São Paulo não podia deixar de se manifestar, como fez com uma Nota de Repúdio, através de sua Assessoria de imprensa, durante a semana que passou. A Arquidiocese não aceita a afirmação de que o fato foi trazido à tona por ela mesma, ou por um “falso blogueiro”, uma vez que nem o próprio autor negou a autoria do escrito, que se encontra atualmente no seu blog, e também nos “sites” relacionados com o mesmo partido. Portanto, o artigo já estava sendo usado na campanha eleitoral, antes da manifestação da Arquidiocese.
Também é inaceitável que na campanha eleitoral se fomente um clima de intranqüilidade entre os cristãos das diversas comunidades e denominações, que convivem na cidade de São Paulo. Temos muito em comum na nossa fé e somos todos cidadãos desta cidade imensa, onde nossa atuação e testemunho comum de fé têm muito a contribuir para o bem da cidade, especialmente no serviço à justiça social, à verdade, à dignidade humana e na solidariedade para com os que mais sofrem e mais precisam das atenções do Poder Público municipal.
Reiteramos nossa orientação para que os fiéis católicos votem de maneira consciente, livre e responsável, e de acordo com os princípios e valores que orientam suas próprias vidas e da fé que abraçam, contribuindo para que nossa cidade seja governada por Autoridades dignas e atentas à promoção do bem da cidade, mais que aos interesses de parte, e capazes de promover a solidariedade e a paz entre todos os habitantes desta Metrópole.
Cardeal D.Odilo P. Scherer
Arcebispo de São Paulo"